FICHAMENTO
MALUF, Sônia Weidner. Corpo e Corporalidade nas Culturas Contemporâneas: Abordagens
Antropológicas. Esboços: Revista do PPG História da UFSC, n. 9, 2001.
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A autora, Sônia Weidner Maluf, possui formação acadêmica jornalística, mestrado e doutorado em antropologia e pós-doutorado em Ciências Sociais. |
O artigo aponta e discute as raízes históricas e
culturais da construção do corpo e da corporalidade. A partir daí, destaca-se
as visões dualistas, entre corpo e espírito e natureza e cultura, desta
construção. Da mesma maneira, apresentam-se as diferentes concepções de corpo e
linguagem corporal em experiências variadas, como, religiosas, de culto ao
próprio corpo, de guerra e de trabalho, e nos mostra uma inquietação que se
compreende pela curiosidade em saber se o corpo é algo além de um simples
objeto de uma construção cultural. O objetivo do estudo centra-se em retratar
abordagens do corpo que adotam este não apenas como objeto da cultura receptor
de sentidos e sim como produtor de sentidos que dispõe de diligência própria.
Com
isso, parte-se de algumas abordagens antropológicas que admitem o corpo como uma
construção social e cultural e não como um dado natural. Por conseguinte, as
ideias do sociólogo e considerado o pai da antropologia francesa, Marcel Mauss,
são apresentadas. Segundo Mauss, o corpo é um objeto da reflexão antropológica
e sociológica e ele tenta mostrar as dimensões sociais do corpo, de sua
construção, e as variedades de representações sociais a ele ligadas. Outros
pensadores como Robert Hertz, um dos colaboradores de Émile Durkheim, pastor e
etnólogo francês, Maurice Leenhardt, são mencionados. Hertz aponta uma notória reflexão
sobre a relação entre comportamento corporal e representações coletivas. Já Leenhardt,
ao estudar a sociedade canaque, na Melanésia, mostra variadas noções
etnográficas de pessoa, mito, corpo e cultura.
Doravante,
salienta-se a relevância do método comparativo antropológico que nos
possibilita uma melhor compreensão de fenômenos culturais. Seguindo o
mencionado método, temos o trabalho, realizado por quatro estudiosos e
publicado em 1979, chamado “A Construção da Pessoa nas Sociedades Indígenas
Brasileiras”. Estudo este que aborda a percepção das sociedades ameríndias que
concebem o corpo como um instrumento que articula sentidos e significados
cosmológicos, como matriz de símbolos e como objeto do pensamento que é
fabricado ou moldado durante toda a trajetória de vida de um indivíduo. Posteriormente,
é analisado o paradoxo entre as concepções hegemônicas de sociedades ocidentais
urbanas, que adotam o corpo como totalmente centrado na noção de indivíduo, e o
ponto de vista das sociedades indígenas, que em relação ao corpo está
intimamente ligado a uma noção de ente inacabado e em constante construção por
meio dos “habitus”, palavra cunhada pelo sociólogo francês, Pierre Bourdieu, e
que significa, grosso modo, o conjunto de maneiras de pensar e agir que se
incorporam ao longo da trajetória do indivíduo no mundo social.
[...]
Destarte, retoma-se a
questão inicialmente abordada no texto que indaga a respeito da autonomia
concedida ao corpo ao pensá-lo como possuidor de uma agência própria e produtor
de cultura. Por fim, parece que o paradoxo existente entre a antropologia e
corpo não foi resolvido, a despeito de ter sido elucidado. Dado que, ao
adotarmos o corpo como uma constituição histórica cultural o separamos como
sendo um acontecimento peculiar e independente. Maluf conclui que, ao
materializarmos o corpo como sujeito, estamos diante de uma nova inquietação:
quem é esse sujeito? E para se discutir tal dúvida é preciso associar o debate
a respeito do corpo e da corporalidade a uma noção de pessoa e de suas
peculiaridades culturais.